"Leonardo dá entrevista em Brasília"

BRASÍLIA - Após 14 meses de versões desencontradas, com prisão de inocentes e apelo até ao serviço de cartomante, a Polícia Civil de Brasília apresentou nesta quarta-feira, 17, o que acredita ser o assassino do ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), José Guilherme Villela, de sua mulher, Maria e da empregada do casal, Francisca Nascimento. Preso em Montalvânia (MG), Leonardo Campos Alves, de 44 anos, ex-porteiro do prédio onde vivia o casal, confessou ter cometido o triplo homicídio para roubar e também porque estaria revoltado 'por ter sido destratado' pelo ex-ministro, que lhe teria negado ajuda para conseguir emprego.

Os três foram mortos em 28 de agosto de 2009 com 73 facadas. Em entrevista à imprensa na sede da polícia, para onde foi trazido, Alves disse que teve um parceiro na chacina, Paulo Mota Cardoso, de 23 anos, sobrinho de sua ex-mulher, mas negou que haja um mandante. 'Não agi a mando de ninguém', disse ele. 'Eu estava indignado com a desfeita dele e também estava passando por vários problemas financeiros e de família. 'Ele me disse que se fosse arrumar trabalho para todo desempregado do prédio, teria de abrir uma agência de emprego e me mandou embora'.

Apesar da 'grosseria', o ex-porteiro alegou que usou violência excessiva 'não por raiva, mas por medo'. Segundo ele, 'o plano inicial era só roubar, mas acabamos matando com medo de sermos reconhecidos'. Sabedor dos hábitos da família, por ter trabalhado no prédio por 15 anos, Alves deu detalhes de como entrou no apartamento, cuja portaria estava só encostada, subiu até o sexto andar, onde vivia o casal e esperou que as vítimas chegassem, escondido atrás de uma pilastra.

Crime. Pela sua descrição, o primeiro a morrer foi Villela. 'Ele abriu a porta por volta das 19h e nós o empurramos com força para dentro'. Pesado, o advogado teria ficado desacordado na queda. 'Fechamos então a porta e pegamos duas facas na cozinha', contou. 'Dei a primeira facada pelas costas, com força, depois meu colega foi conferir se ele estava vivo e demos várias golpes mais para garantir que estivesse morto', narrou.

Pela narrativa, a seguir foi abatida Maria, que ainda tentou demovê-los do crime oferecendo dinheiro, joias e o que eles mais quisessem. Ele disse que recebeu US$ 27 mil, trocados por R$ 50 mil e uma certa quantidade de joias, vendida por R$ 9 mil. 'Ela perguntou se eu queria mais, mas como não tenho experiência em assalto, disse que bastava', contou. 'Mandei então que ela deitasse e quando ela estava no chão, meu colega deu a primeira facada, pelas costas e nós continuamos golpeando até ela morrer'.

Por último, chegou Francisca, que havia saído para fazer compras da casa. Ele disse que a empregada morreu por infortúnio porque quando chegou, os dois já estavam de saída. 'Tivemos de matá-la também para ela não nos delatar', afirmou. 'Das três, é a morte que eu mais me arrependo, fui muito azar', contou. Depois os dois retornaram para Montalvânia, a cerca de 600 quilômetros de Brasília, onde Alves foi morar após perder o emprego, em 2009, três meses antes do crime.

Erros. A confissão do ex-porteiro desconcertou a Polícia Civil, que cometeu vários erros na investigação e já havia incriminado a arquiteta Adriana Villela, filha do casal, como co-autora do crime, de olho na herança do pai, dono de uma das bancas de advogados mais requisitada de Brasília. Ela nega a acusação e espera o desfecho do caso para decidir que medidas judiciais vai adotar. 'Precisamos aguardar o resultado com cautela porque se eles erraram absurdamente comigo, podem estar cometendo novas injustiças', criticou.

O diretor-geral da Polícia Civil, delegado Pedro Cardoso, considerou a confissão de Alves harmônica com a posição dos corpos, a cena do crime e as provas periciais até agora produzidas, mas não descarta o envolvimento de uma terceira pessoa na triplo homicídio. Ele vai levar Alves para reconstituição do crime no imóvel e disse que, por enquanto, não vai excluir o nome de Adriana do rol de suspeitos. Embora as evidências mostrem que a polícia e o Ministério Público erraram ao denunciá-la, tecnicamente ela continua ré no processo, acusada de coautoria.

Cardoso participou das buscas em Montalvânia e disse que a polícia encontrou joias roubadas e ouviu pessoas envolvidas também na troca dos dólares. A mulher do ex-porteiro confessou ter recebido de presente do marido um pingente roubado, que pertenceria à coleção de Maria. Mas para ele, o caso não está encerrado. 'Demos um largo passo na investigação, mas precisamos estabelecer de forma muito criteriosa a conduta de cada um no local do crime, a participação efetiva, o proveito obtido com o produto do roubo e as motivações'.

O promotor Maurício Miranda, que ofereceu a denúncia contra Adriana, aceita pela justiça, pediu o afastamento do caso da delegada Débora Menezes, da 8ª DP, cujas investigações paralelas levaram à prisão do ex-porteiro. Ele quer também de fora o juiz Sandoval Barbosa, que determinou o arquivamento da denúncia contra a filha do casal. Para ele, Adriana é suspeita de envolvimento no crime porque tinha relação conflituosa com os pais por dinheiro e foram encontradas digitais dela no apartamento, indicando sua presença no dia dos homicídios.

Alves contou que, desde o crime, prestou depoimento duas vezes, intimado pela delegada Martha Vargas, da 1ª DP, a primeira encarregada do caso, mas negou participação. Autora de atropelos, como seguir pistas falsas por orientação de uma vidente, Martha acabou afastada do cargo e do caso e responde a processo administrativo interno. O ex-porteiro alegou que, desde a demissão, meses antes do crime, vivia em Montalvânia, onde estaria no dia dos homicídios e ela aceitou o álibi.

Só recentemente, após a prisão de um filho de Alves por porte de drogas e mais recentemente a do parceiro Paulo, acusado de um outro assassinato na região de Montes Claros, a Polícia retomou a pista abandonada. O filho de Alves fez confidências com outros presos na penitenciária da Papuda e, durante uma reportagem sobre o crime, mencionou joias que o pai vendera na cidade.